quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Ontem, um dia como (todos) os outros…

Escurece e adormeço. Deitado, estirado na cama. Exaustão provinda de cansaços vários. Não recordo sequer qualquer luz acesa, fosse do candeeiro do lado, assente em mesa de cabeceira, ou dos holofotes pregados no tecto, mirando três direcções mais ou menos distintas. Com a roupa que trazia vestida no corpo, despojo de um dia. Pancada forte. Um livro de metodologia e um caderno de notas repousam à direita, pela esquerda o portátil desligado mantendo um precário equilíbrio, posto ao alto, entre os rebordos da cama e os alicerces do chão de madeira. Não estou cá. Fugi. Algures nos meus sonhos vou correndo cenários, cenários já esvaídos da memória. Cenários urbanos, só podia. Quem te disse que era correcto teres-te definido como pária urbano? Efeito boomerang, arranjaste a bronca agora suporta-a; e sem queixumes, para quê, aliás?
Às duas, não precisamente às duas, mas por aí, o telefone toca. Acorda-me. Vejo o número. Ligo de volta. Já estou acordado? Uma voz mais humana do que a minha atende. As notícias não são boas, mas, credo, muito longe do catastrófico. Tenta-se ver a realidade tal qual ela é. É mau, mas resolve-se num instante, vais ver; já sabemos do que se trata, se não soubéssemos seria, talvez aí sim, mais alarmante. Nada catastrófico, já o escrevi, mas sempre desassossega. Olho o relógio. E outro. E mais outro ainda. Que horas seriam ao certo? Dou agora conta do livro e do caderno, do computador quase caído a um fio de se estatelar redondo no pavimento. Nem lhes toquei.
O sono foi-se, a cabeça matuta preocupações que em breve estarão sanadas, apenas a representação do pária urbano se mantém de pé firme. A opção é não voltar a dormir. Vai-se para o outro computador, no escritório. Irmão grande do primeiro, pelo menos di-lo-ia observando o absurdo na discrepância das dimensões, o espaço que ocupa mais do que a triplicar. Fazem quase o mesmo, mal se notam as diferenças e é quando se notam; todavia, que faces tão diferentes. O corpo queixa-se, dói a cabeça; não quer, todavia, descansar o que nela mora, cérebro electrizado pelos últimos estímulos que o açoitaram.
O mail é a primeira coisa que se vê, ou não vê que não há. Distribuem-se janelas com browsers de internet a mostrar páginas e mais páginas. Olho o blog e prometo-lhe pela enésima vez que um dia apago-te e pronto, ameaça sempre reiterada e nunca cumprida. A secretaria virtual da faculdade, raios partam que não há maneira de lançarem as notas que sobejam… já cansa e quero terminar o plano curricular, arrumá-lo de vez sem que lhe volte a pôr nem olho nem atenção alguma em cima. Outras tantas páginas, percorrem-se por elas olhares que o são em molde aleatório. A atenção prende-se e desprende-se, diversificada como também são os conteúdos e sentidos das páginas remanescentes. A internet é perfeita para um pária. Tudo é casa como tudo é estranho. Quero lá saber. Mas quero…
É vez de me virar para o i-tunes e pôr a playlist a correr. Músicas em tons desiguais e línguas múltiplas, também aqui, observo, ninguém se entende; esta casa também não é a casa delas, sendo; imitadoras; que coisa esta de, por seu turno, também quererem ser párias. Penso dizer-lhes que não vale a pena, contudo estou já demasiado acordado para dialogar com músicas. Não tenho sono, não tenho igualmente a certeza se estou de facto acordado; estarei tão somente a ser mimético, acordado por procuração? Seja como for, faço por arredar a ideia do pária. Afinal não se tratará de coisa excessiva, uma obsessão compulsiva auto-induzida, cujos contornos desagradáveis acabam obtendo algum gáudio por um processo de vitimação? Sei lá. Falta de sono. Cama vazia. Sítios errados. Repouso em míngua, inconsistente. Penso que a Lua existe. Mais cheia, certamente, para os lados do sul, bem mais a sul. Aí brilhará mais vistosa, tal como é. Mas também aqui existe, não menos vibrante, também aqui a sinto por perto. Menos prosaico, penso terminar o trabalho que resta entregar, em afinar o projecto de tese como me encomendaram. Com prudente sensatez e seriedade penso no trabalho e na altura de começar a obter ganhos, lucros, facturar… Esta noite foi quase igual, copycat.
Preciso de férias.

untitled, 1981, jean-michel basquiat



I'd only come here seeking peace.
I'd only come here seeking me.

In your dream you see me clear
I have no restraint, no fear
Powerless I watched from faces I'd assumed.
My purpose set. My will defined.
Caress the air.
Embrace the skies.
Escape the sorrow and restraint of mortal cities.

Give me time I will be clear.
Given time you'll understand
What possesses me to right what you have suffered.
I'm in this mood because of scorn.
I'm in a mood for total war.
To the darkened skies once more and ever onward.
There is no faith in which to hide.
Even truth is filled with lies.
Doubting angels fall to walk among the living.
I'm in this mood because of scorn.
I'm in a mood for total war.
To the darkened skies once more and ever onward.

(…)

I'd only come here seeking peace.
I'd only come here seeking me.


Darkangel’, VNV Nation (Das Ich mix)

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