sexta-feira, 16 de abril de 2010

Quem escuta nem sempre ouve

Nada tem de invulgar que o silêncio assuste, mesmo quando sobejamente enleado por uma panóplia de sons diversos e até, porque não, gritantes ou estridentes. O silêncio não se sente perturbado por sons que em nada lhe dizem respeito, permanecendo, firme, na sua altivez. O silêncio que construímos impele-se mais alto do que qualquer ruído que se lhe atravesse. Nestes moldes, o silêncio não é de ouro; nem de prata; nem mesmo de latão. Este silêncio é absoluto, de um absolutismo rude e empertigado, silencia inclusivamente os gritos que do interior das entranhas querem explodir em todo o redor do mundo. Este silêncio é perverso. Perverso e tão perverso ao ponto de nos compelir a não escutar as nossas próprias cogitações. É um silêncio que enrijece o músculo cardíaco, tornando tenebrosa a mais cândida alma sem vacilar à contrição.

Com a sua solidão e obscurecendo o espírito avilta a nossa condição humana. Derruba. Degrada. Consome. E se este círculo não se vir inexoravelmente quebrado, por obra exequível apenas pelos homens, então consumirá sem piedade até que por fim se extinga a sua chama aniquiladora, deixando por rasto tão somente terra queimada e solo estéril.

O encantamento provindo da acção de um ser humano dissipará, assim o desejando e assim agindo, o silêncio arguto e perverso. Quanto a esta asserção, não me paira qualquer dúvida, nenhum será, nenhum como; convicção de que quem fala sabe do que fala.

É momento para agora abandonar as palavras, de estancar a fluidez da escrita: o silêncio é pesado.



"Sem comunicação não existem relações humanas nem vida humana propriamente dita."

'A Improbabilidade da Comunicação', Niklas Luhmann

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