segunda-feira, 11 de julho de 2011

Prudência...

... segundo Nietzsche:

"Neste momento não é bom viajar nesta região;
(...)
Vão-te atrair, vão-te amar a ponto de te dilacerarem:
São espíritos exaltados... e a esses falta sempre
   o espírito."

'A Gaia Ciência', Friedrich Nietzsche
Alguma sapiência ainda não paga imposto. Valha-nos isso.


the annunciation (dove detail), 1528, il garofalo

Traços de personalidade

Escassíssimas serão as pessoas que não buscam ombro amigo no ente amado. Acontece que somos todos imperfeitos, laboramos melhor certas características enquanto outras são, ainda que mesmo não conscientemente, relegadas para o quase desleixo e eventual esquecimento. Somos humanos. Temos, portanto, de contar obrigatoriamente com a nossa entropia constante; não querer tudo é um bom primeiro passo a fim de aceitarmos as nossas naturais limitações.


guns, 1981-82, andy warhol


"I need your arms around me, I need to feel your touch
I need your understanding, I need your love so much
You tell me that you love me so, you tell me that you care
But when I need you baby, you're never there

On the phone long, long distance
Always through such strong resistance
First you say you're too busy
I wonder if you even miss me

Never there
You're never there
You're never, ever, ever, ever there

A golden bird that flies away, a candles fickle flame
To think I held you yesterday, your love was just a game
A golden bird that flies away, a candles fickle flame
To think I held you yesterday, your love was just a game

You tell me that you love me so, you tell me that you care
But when I need you baby
Take the time to get to know me
If you want me why can't you just show me
We're always on this roller coaster
If you want me why can't you get closer?

Never there
You're never there
You're never ever ever ever there
"

'Never There', Cake

domingo, 26 de junho de 2011

Ser-se empedernido

Perdoa-me nem um abraço te ter conseguido oferecer.
O mundo não é perfeito, todos o sabemos.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Senso comum

O que sobe ao céu faz-nos descer ao inferno.


"I am the son 
and the heir
Of a shyness that is criminally vulgar 
I am the son and heir
Of nothing in particular

(...)"

'How soon is now', the smiths


quarta-feira, 8 de junho de 2011

Quando o absurdo faz sentido

Amanhã é outro dia. Amanhã. Amanhã, amanhã, amanhã… É escusado esperá-lo, nunca virá. É o seu destino, profecia que se cumpre nunca acontecendo. Até amanhã estamos ancorados ao hoje, hoje cujo destino é também igual: jamais ver o fim. Hoje. Repete-se, repete-se. Repete-se numa redundância perfeita. E o que foi ontem. Não se revive. Quanto muito recorda-se a custo de exercício de memória. Ontem, passado deixado para trás. Memória de hoje, fantasma de amanhã. Não vale a pena aguardar nem olhar para trás, agrilhoados ao relógio que se repete à força de conceitos deterministas. Não vale.


Der Rosenweg in Giverny, 1920-22, Claude Monet

segunda-feira, 6 de junho de 2011

terça-feira, 31 de maio de 2011

Proto-Percursos

Um(a) gajo(a) às vezes não sabe o que anda cá a fazer. Há que descobrir. O sentido pode estar velado, mas não implica que seja absolutamente impossível descortiná-lo.


"Ainda lembro o que passou
Eu, você, em qualquer lugar
Dizendo:
«Aonde você for eu vou»
Oh! Oh!...
E quando eu perguntei
Ouvi você dizer
Que eu era tudo
O que você sempre quis
Mesmo triste eu tava feliz
E acabei acreditando
Em ilusões...
Eu nem pensava em ter
Que esquecer você
Agora vem você dizer:
«Amor, eu errei com você
E só assim pude entender
Que o grande mal que eu fiz
Foi a mim mesmo»...
Uh! Uh! Uh!...
Vem você dizer:
«Amor, eu não pude evitar»
E eu te dizendo:
«Liga o som, uh! uh! uh!
E apaga a luz»
Uh! Uh! Uh! Uh!...
Ainda lembro o que passou
Eu, você, em qualquer lugar
Dizendo:
«Aonde você for eu vou»
Oh! Oh!...
E quando eu perguntei
Ouvi você dizer
Que eu era tudo
O que você sempre quis
Mesmo triste eu tava feliz
E acabei acreditando
Em ilusões...
Eu nem pensava em ter
Que esquecer você
Agora vem você dizer:
«Amor, eu errei com você
E só assim pude entender
Que o grande mal que eu fiz
Foi a mim mesmo»
Uh! Uh! Uh! Uh!...
Vem você dizer:
«Amor, eu não pude evitar»
E eu te dizendo:
«Liga o som, uh! uh! uh!
E apaga a luz»
Uh! Uh! Uh!...
Ainda lembro o que passou
Ainda lembro como era bom
Ainda lembro inda lembro
Ainda lembro, inda lembro
Oh! Oh! Oh! Oh!
Ainda lembro..."
'Ainda Lembro', Marisa Monte

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Num destes dias

O pôr-se do astro solene visto da baía de Cascais é música solene, interpretada no interior de cada um conforme a sua batuta. O mar escama-se e muda de cores, quase que à escolha da vontade de cada ser único. A brisa suave e amena, despertada como que a propósito de um momento tanto instantâneo como infinito.
Os derradeiros raios de Sol tocam a superfície do rosto, das mãos, despedem-se prometendo sempre o amanhã. Olho-o de frente mas mesmo na sua luminosidade tardia obriga os olhos a brilhar e a cerrarem-se, ainda que providos com os inevitáveis óculos de sol que escondem essas janelas.
Sentado no chão de pernas cruzadas volto a olhá-lo por mais uma vez. Ergo-me. Começo a caminhar, vou-me. Entretanto, estipulo com ele num pacto secreto: se vieres amanhã, também eu voltarei a subir os olhos para ti com um sorriso, por ti, aquecido.


"Só hoje senti
Que o rumo a seguir
Levava pra longe
Senti que este chão
Já não tinha espaço
Pra tudo o que foge
Não sei o motivo pra ir
Só sei que não posso ficar
Não sei o que vem a seguir
Mas quero procurar

E hoje deixei
De tentar erguer
Os planos de sempre
Aqueles que são
Pra outro amanhã
Que há-de ser diferente
Não quero levar o que dei
Talvez nem sequer o que é meu
É que hoje parece bastar
Um pouco de céu
Um pouco de céu

Só hoje esperei
Já sem desespero
Que a noite caísse
Nenhuma palavra
Foi hoje diferente
Do que já se disse
E há qualquer coisa a nascer
Bem dentro no fundo de mim
E há uma força a vencer
Qualquer outro fim

Não quero levar o que dei
Talvez nem sequer o que é meu
É que hoje parece bastar
Um pouco de céu
Um pouco de céu"

'Um Pouco de Céu', Mafalda Veiga

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Gentes de (especial) relevo

É óptimo constatar que continuam a existir grandes mulheres no nosso país; mesmo quando têm pimenta na língua.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Mioleira

Vão quase doze. Como é que quatorze horas por dia não são o suficiente para terminar um trabalho? Definitivamente, devo ter que fazer o download de um modelo nórdico para o meu cérebro; excepto o Islandês, dispenso a falência técnica dos meus amados neurónios.

PS: Relembrar jamais concorrer a um Pos-Doc.

sábado, 21 de maio de 2011

Os filhos da cidade

Onde ando eu, que não me consigo encontrar? Perdido algures na pele de alcatrão e cimento desta cidade que tanto amo, Lisboa. Talvez ande às voltas, desenhando círculos e regressando sempre com a mesma inevitabilidade ao lugar donde partira. Que faço? Nas entranhas do meu carro vejo outros tantos semelhantes; vejo gentes com olhos vítreos a arrastarem-se pelos passeios que marginam as estradas e, pontualmente aqui e ali, observo nos olhos de um estranho o emanar da felicidade – são os únicos que se distinguem verdadeiramente do resto da manada e que têm uma aparência humana completa e que vivem ao invés de se limitarem a existir. Ainda no carro, com a testa a querer suar pela temperatura quente que se faz sentir, reviro-o com os olhos: o volante já gasto, estofos queimados por beatas que não atirei pela janela com sucesso, três ou quatro garrafas de plástico ainda com alguma água na barriga, uma radiografia tirada faz muito atirada para os bancos de trás e papéis, vários papéis imprestáveis, fazem de tapete a pés que ali queiram assentar; o banco do lado, o banco ao meu lado, vazio. Nem os fantasmas lá vivem, partiram e deixaram-me só. Nem suspiro, volto a colocar os olhos na estrada, olhos cujos únicos estímulos são o negro do tapete da estrada, o plástico do pára-choques dos outros, luzes que piscam e luzes que se mantêm firme e teimosamente acesas; os meus olhos estão perdidos, notam todos estes estímulos mas a verdade é que não estão lá, como também não estão em sítio algum: estão como eu. 

Outros estímulos que arrepiam o meu corpo são os sonoros. Do interior do automóvel é o auto-rádio que fala e canta, só não dança, desde que dou à ignição até rodar a chave em sentido inverso. Poucas vezes me dou ao trabalho de colocar um cd, pelo que deixo às estações da rádio o ditar daquilo que me irá penetrar pelos ouvidos. Uma vez por outra há uma melodia que me eriça os pêlos e, por breves instantes, volto a estar onde todos estamos. Já sou quase que inteiramente indiferente aos ruídos dos tipos que adoram ter a mão na buzina, entra por um lado e sai ainda mais depressa pelo outro; por vezes dou por mim a encolher os ombros, mais raramente com vontade de explicar a um ou uma condutora que o meu carro não é primo do Pégasus e que por isso não tenho asas que me façam voar – mas quase sempre permanece o silêncio, cansa-me o simples facto de ter de comunicar com alguém principalmente quando esse alguém, autista, não está disposto a escutar. Então, volto a fechar-me em mim mesmo, na minha redoma em moldes de cidadela, e volto a fugir da realidade. Posso nada fazer em relação ao meu corpo, todavia a minha mente transporta-se para outros lugares que até de mim são desconhecidos – voa para longe, para outros tempos talvez… 
Dou comigo sentado numa esplanada de praia. Afinal era mesmo para aqui que eu queria vir; ou que me constranjo a vir no cumprimento de obrigações estabelecidas. Há qualquer coisa no mar que me sossega, apazigua-me o ser, embala-me como se eu fosse pequenino. Olho-o sem que me canse. Se a indumentária que cobre o corpo fosse outra sem dúvida que iria sem parar um instante para pensar até junto dele, caminhando por onde a areia está molhada do salivar oceânico. Por vezes tenho que me conter para não arregaçar as calças, quase sempre de ganga, para não desabotoar a camisa até ao seu derradeiro botão, para não tirar os ténis ou uns sapatos de vela, para não ir sentir o mar acariciar-me as ferraduras também sem meias, desnudadas e ávidas por serem tocadas; até aos tornozelos, porque não, deixaria que o sal arrepanhasse os meus pêlos até à vinda de nova vaga de água fria – e repeti-lo-ia mil vezes ou mais. Contemplaria, então, com o sol a coser-me a pele desnudada, a linha do horizonte onde o mar parece querer beijar o céu antes de com ele se enrolar na maior das volúpias, deixando-me confuso por não mais conseguir distinguir qual é qual – confuso, sim; todavia, profundamente sereno; e sentir que, afinal, a vida é boa de se viver.


"Well... you didn't wake up this morning
Because you didn't go to bed
You were watching the whites of your eyes
Turn red
The calendar, on your wall, is ticking the days off
The calendar on your wall is ticking
the days off
You've been reading some old letters
You smile and think how much you've changed
All the money in the world
Couldn't bring back those days.
You pull back the curtains, and the sun burns into your eyes,
You watch a plane flying across a clear blue sky.
This is the day - Your life will surely change.
This is the day - Your life will surely change.
You could've done anything - if you'd wanted
And all your friends and family think that you're lucky.
But the side of you they'll never see
Is when you're left alone with the memories
That hold your life together like
Glue
"

'This Is The Day', The The

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Metaforicamente...

Aceito inscrições.


"Vows are spoken
to be broken"

'Enjoy the Silence', Depeche Mode

terça-feira, 17 de maio de 2011

Rocambolesco

Exausto de tentar perceber o que querem que eu seja quando eu próprio pareço não bastar.


"Wow, I’m sick of doubt
Live in the light of certain
South
Cruel bindings.
The servants have the power
Dog-men and their mean women
Pulling poor blankets over
Our sailors


I’m sick of dour faces
Staring at me from the tv
Tower, I want roses in
My garden bower; dig?
Royal babies, rubies
Must now replace aborted
Strangers in the mud
These mutants, blood-meal
For the plant that’s plowed.


They are waiting to take us into
The severed garden
Do you know how pale and wanton thrillful
Comes death on a strange hour
Unannounced, unplanned for
Like a scaring over-friendly guest you’ve
Brought to bed
Death makes angels of us all
And gives us wings
Where we had shoulders
Smooth as raven’s
Claws


No more money, no more fancy dress
This other kingdom seems by far the best
Until it’s other jaw reveals incest
And loose obedience to a vegetable law.


I will not go
Prefer a feast of friends
To the giant family."

'The Severed Garden', The Doors

Niilismo (?)

- Quem és tu?
- Talvez só Zaratustra o saiba; mas avanço desde já não ser o seu super-homem.

"I took a walk around the world to 
Ease my troubled mind 
I left my body laying somewhere 
In the sands of time 
I watched the world float to the dark 
Side of the moon 
I feel there is nothing I can do, yeah 

I watched the world float to the 
Dark side of the moon 
After all I knew it had to be something 
To do with you 
I really don't mind what happens now and then 
As long as you'll be my friend at the end 

If I go crazy then will you still 
Call me Superman 
If I'm alive and well, will you be 
There holding my hand 
I'll keep you by my side with 
My superhuman might 
Kryptonite 

You called me strong, you called me weak 
But still your secrets I will keep 
You took for granted all the times I 
Never let you down 
You stumbled in and bumped your head, if 
Not for me then you would be dead 
I picked you up and put you back 
On solid ground 

If I go crazy then will you still 
Call me Superman 
If I'm alive and well will you be 
There holding my hand 
I'll keep you by my side with my 
Superhuman might 
Kryptonite"


'Kryptonite', 3 Doors Down

domingo, 15 de maio de 2011

Mensagem

Em cinco anos se vivem e experenciam cinco mil. Sem duvidar.

Sem mais palavras, as palavras do Palma.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Nesta cama me deito

Recolho cedo ao vale dos lençóis. O cansaço, não só físico mas especialmente o mental, acomente-me o corpo. Hoje nem uns espartanos minutos dedicarei à leitura de cabeceira. Precisava de nascer outra vez.
Sweet dreams...


the kite, 1926, marc chagall

sábado, 30 de abril de 2011

Lagarto

Sempre. Inveterado, inflexível, convicto e sem cura. Excepto num pormenor: não sou adepto de seguir nem jogos, pontuações, golos marcados vs sofridos, blá, blá, blá.
Aliás, hoje foi a primeira vez que pus os pés no Alvalade XXI. Um dos espetáculos foi ranhoso e de meter dó: a partida em si (2-1 contra um Portimonense mediocre). Outro foi um deleite: a "Casa de Banho" é bem mais interessante observada na perspectiva interior. Lamento apenas que não tenha podido cumprir um compromisso de tempos idos. Porém, há tempos para tudo...
Talvez lá regresse daqui a uma década ou assim. Mas o Sporting (a ferros) lá ganhou. Por ora é que baste.




quarta-feira, 27 de abril de 2011

Rapaziada difícil

Então um tipo quando não está para se aborrecer com o por vir, também dito futuro, olha para dentro e, em sinal de quem finge estar pesadamente atarefado, encolhe placidamente os ombros.


"As pessoas achavam que ele era difícil por ser tão calado. Esse seu silêncio parecia incomodar as outras pessoas, bem como o facto de gostar de estar sozinho."

'O Sonhador', Ian McEwan

domingo, 24 de abril de 2011

Fácil de entender

- Porque insistes?
- Para continuar.


Avenue in Schloss Kammer Park, Gustav Klimt, 1912

"hold my head
we'll trampoline
finally through the roof
on to somewhere near
and far in time
velouria
her covering
travelling career
she can really move
oh velveteen!

my velouria, my velouria
even i'll adore you
my velouria

say to me
where have you been
finally through the roof
and how does lemur skin
reflect the sea?

we will wade in the shine of the ever
we will wade in the shine of the ever
we will wade in the tides of the summer
every summer
every summer
every
my velouria
my velouria

forevergreen
i know she's here
in California
i can see the tears
of shastasheen

my velouria, my velouria
even i'll adore your
my velouria
"

'Velouria', Pixies

sábado, 23 de abril de 2011

Lentes desfocadas

Foi assim. Um tornou à esquerda. O outro à direita. Os demais somaram em frente.




"Je t'aime je t'aime
Oh oui je t'aime
Moi non plus
Oh mon amour
Comme la vague irrésolue
Je vais, je vais et je viens
Entre tes reins
Je vais et je viens
Entre tes reins
Et je me retiens

Je t'aime je t'aime
Oh oui je t'aime
Moi non plus
Oh mon amour
Tu es la vague, moi l'île nue
Tu vas, tu vas et tu viens
Entre mes reins
Tu vas et tu viens
Entre mes reins
Et je te rejoins

Je t'aime je t'aime
Oh oui je t'aime
Moi non plus
Oh mon amour
Comme la vague irrésolue
Je vais, je vais et je viens
Entre tes reins
Je vais et je viens
Entre tes reins
Et je me retiens

Tu vas, tu vas et tu viens
Entre mes reins
Tu vas et tu viens
Entre mes reins
Et je te rejoins

Je t'aime je t'aime
Oh oui je t'aime
Moi non plus
Oh mon amour
L'amour physique est sans issue
Je vais je vais et je viens
Entre tes reins
Je vais et je viens
Je me retiens
Non! maintenant viens..."

'Je t'aime... Moi non plus', Jane Birkin & Serge Gainsbourg

quarta-feira, 20 de abril de 2011

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O Céu não é só para os homens

Sábado. Dia dezasseis. O amigo felpudo e meigo iniciou outra jornada. Partiu sem partir de verdade; guardamo-lo, com vincada vontade, no mais íntimo de nós. Não tive o privilégio de o conhecer tão bem quanto outros, outros esses indubitavelmente os mais queridos do seu coração. Porém, não exagero se disser que também eu firmei laços, que gostava de crer recíprocos, com esta criatura tão única. Guardo dele boas, muito boas, memórias e estas pertencer-me-ão até ao meu derradeiro suspiro. Estimado amigo felpudo, fizeste feliz boas almas que o mereceram, mesmo quando as tuas tropelias aconteciam graças ao teu carácter tantas vezes brincalhão. Levaste uma boa vida, creio que se mo pudesses contar o confirmarias, longa e boa vida. Eu talvez só tenha passado pela tua vida por uns três anos, aqui e ali, quando uma qualquer oportunidade nos conduzia ao encontro. Por vicissitudes da vida, que é assim mesmo, ter-te-ei visto e acariciado pela última vez quando corriam os primeiros tempos do ano de 2010; ou terá sido no último mês de 2009? Pouco importa. Bem se sabe que quantidade amiúde não é tudo. Aceno-te agora o adeus final, recordando como me observavas atento, língua para fora, com os teus belos tiques naturais que faziam ascender ou descer as tuas orelhas. Sempre os apreciei. Como gostavas de apreciar tudo o que te rodeava…
As mais fortes lembranças que para sempre terei de ti levam-nos ao Verão de 2008. Por essa altura estava a tentar terminar a redacção da minha tese, tese que me conduziria ao grau de mestre. Sei que sou descuidado com as horas, que sou pouco ortodoxo quando se trata de horários. Recordo-me sentado no sofá, decorriam as Olimpíadas em Pequim, digitando ao computador aquelas que seriam as palavras com que encerraria a tal tese – sendo que ainda tinha um considerável trabalho pela frente; as últimas são não invulgarmente as mais difíceis, talvez até as mais decisivas. De quando em quando, já a madrugada abraçava o nosso mundo, saía da casa para fumar um cigarro. Ia pé ante pé, não querendo importunar o teu sono. Mas tu, invariavelmente, e fosse como fosse que eu me comportasse, davas sempre por mim, adivinhavas a minha presença. Tal qual uma qualquer inevitabilidade. Raras eram as vezes que fazias barulho, como que se soubesses que a minha presença ali era algo contra a regra, infiltrada e não expectável. Ainda assim ouvia-te saíres do teu sono, começando a percorrer a calçada ao meu encontro. Eu acendia um cigarro. E outro. Via as estrelas e observava a Lua. Tentava desanuviar e aliviar o peso que sentia às costas. E tu, companheiro, vinhas célere mas calmo até mim. Olhavas-me e sentia que me reconhecias. Sempre. Sentavas-te então ao meu lado, quase sempre deixavas o teu corpo descair até que encontrasse as minhas pernas, comportamento que nos fazia sentirmo-nos mutuamente mimados, desejados, queridos, compinchas naquele então. Quando estavas mais cansado e o sono te moía o corpo esticavas-te deitado ao longo do chão, apoiando a queixado num dos meus sapatos. De uma forma ou de outra sentia invariavelmente o teu peso, como invariavelmente sentia que ali contigo jamais estaria sozinho – mesmo que eu buscasse a solidão; como eu te agradeço, mesmo que sem palavras para definir essa gratidão.
Desde o primeiro dia que te vi, Napoleão, ficou-me firme a sensação que tinha deixado em ti uma boa imagem e que tu, a par das pessoas que tão bem me aceitaram no seu íntimo refúgio, me asserias que eu tinha passado o teste e que podia partilhar de uma intimidade com a tua dona. Cheiraste-me, é claro, querias conhecer-me também pelo faro. Não me repudiaste com um ladrar invejoso ou cauteloso, coisas que são diferentes mas que poderiam, ambas, despertar os teus instintos. Foi com à vontade que pela primeira vez a minha mão poisou no teu pêlo. Se eu passei pelos teus testes deve ser dito, em abono da verdade, que ao conhecer-te apercebi-me, facto imediato, que me cativaras. Foi bom conhecer-te, Napoleão. Foi tão bom que me deixasses conquistar de forma tão breve a tua confiança e carinho que após o primeiro encontro sempre demonstraste por mim. Napoleão, não voltarei à despensa para recolher as tuas guloseimas e entregá-las às tuas ávidas mandíbulas. Estava escrito que não mais o faria, mesmo que a tua vida não tivesse sido abruptamente ceifada porque estava a chegar ao fim e ninguém poderia fazer nada que o impedisse. Adorava esses momentos, pulavas para mim adivinhando com a inevitabilidade habitual que carregava um biscoito para ti; por mais que o tentasse esconder tu sabias sempre, com os teus apurados sentidos.
Para mim foste uma estrelinha que me deixava feliz e de boa disposição. Para outros foste uma vida, mais não seja a tua – o que não é dizer pouco. Eras e sempre foste muito querido. Escutava como te falavam, não era difícil de compreender que tu, embora não humano, fosses parte integrante de uma família. Fui contaminado pela tua maneira de ser, o que me levou a adorar-te e a respeitar-te na tua condição de cão quase gente. Não há mais biscoitos. Não há mais brincadeiras de bola. Não voltarei a ver os teus saltos acrobáticos. Não te voltarei a ver a rebolar no chão, carregado de festas e mimos. Lamento que tudo isto não aconteça só porque já não me cabia mais a mim ver-te. Que tenha sido a morte a interromper o ciclo que te estava destinado.
Nós homens somos demasiado arrogantes, é algo visceral. Todos os crentes das grandes religiões inventam espaços para si no pós vida, esquecendo-se que não somos os únicos seres a soprar vida. Eu não sou desses. Nem sou crente. Todavia, se há Céu este será também para ti e para todos os outros que nascem, vivem, reproduzem-se e, quem sabe, amam e, que, por fim terminam padecendo do mal para além da existência que é a morte.
Até já, Napoleão. Lindo.



Lembrando-me de uma menina:

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Beijo

Hoje é o dia internacional de quê? Arre, assim haverá, breve, dias protocolados até para...
Já agora, pomposamente recupero Klimt:




Ainda se admiram com a crise...

terça-feira, 12 de abril de 2011

Justificar o injustificável.

Não sei para que serves, o que mais hei-de escrever para, por aqui. Há muito que devias estar morto. Todavia ressuscitei-te. Escuso-me a justificações, mais por crer que nem eu as conheço bem, nem eu me sinto esclarecido.
É quase ímpio voltar a pintar de letras este cantinho. Silencio-me por ora. Dissesse o que dissesse, cuspisse o que cuspisse, não obteria qualquer gratificação - talvez só mesmo o inverso.

"it's not war, it's just the end of love."

http://www.youtube.com/watch?v=Jz2gvAApY2A&feature=player_embedded

segunda-feira, 11 de abril de 2011